quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Finados



No segundo dia de novembro:
por favor, reze por mim!

Reze por tudo aquilo que não fiz
e por tudo aquilo que me fez pecar.

Reze pela minha inércia
e pela minha total falta de caráter.

Reze em voz branda:
a fim de não espalhar minhas mil mazelas.

Reze em qualquer religião
em qualquer canto da sala.

Ore nas estátuas de gesso
ore virado para Meca.

Pois já não posso ver a luz
eu já não posso nada.
E aguardo nesse teu murmúrio
uma suposta fuga deste meu refúgio.


(Berg Nascimento)


* foto de Márcia Foletto

* Poema escrito em 2006

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Vinho & Vermute



Quisera saber de toda tua complexidade
ser uma pequena cidade no Mediterrâneo
e te contemplar do palato até os rins.

Curar toda mediocridade
a cada gole desse elixir
que me faz rever amigos
como se estivessem aqui.

E cada vez que viro a taça
sou mais amigo de Baco
sou todos os vinhedos...

E nesse hotel barato
torno-me cavaleiro lunar
brindo com minha sombra
que me parece acompanhar.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Père-Lachaise para ser eterno



Quero minha lápide em Père-Lachaise
E poder deteriorar meu corpo comum
Junto aos meus semi-deuses eternos
E misturar-se ao solo em suas essências.

Uivar a noite ao lado de Édith Piaf
Ser personagem mórbido de Balzac
Discutir com Proust morte após a vida
E beber até cair vivo com Morrisson.

Quero minha lápide em Père Lachaise
Sob a rua das pedras que choram
E Alimentar o musgo que cobre o mármore
Saciar a sede das árvores que tocam o céu.

Mas enquanto meu corpo ereto
Ainda tenta nobre arte exumar
Declamo aos portões do cemitério
Versos para poder me eternizar.

(Berg Nascimento)

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Poesia inacabada


Poesia inacabada
Amor que vai acabar
Lua que me sangra o peito
Que horas irei chorar?

(BergNascimento)

domingo, 3 de julho de 2011

O oráculo de Rimbaud



Um chacal percorre a savana:
inquieto, andarilho, viajante...

Demónios aprisionados em sua retina
como uma caravana de ladrões sedentos
revelam reis, armas, dor...

Ele tem pele de marfim
e olhos azuis pra te enfeitiçar.

Sabe que ao atravessar o Portal das Lágrimas,
poeta e chacal serão separados pra sempre.

Charleville ficará pra trás...

Mas como abandonar a poesia
se ela flameja dentro de ti?
Um chacal não perde o faro.

Terás teu corpo mutilado...
Mas isso é para que possas voar.

E quando céu e inferno
te abrirem hospedarias,
seguirás teu próprio caminho.

(Berg Nascimento)

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Ciranda celeste




Quando meus olhos fundem céu e mar
numa espécie de duelo celestial
há um certo jogo de brincar.

Toda água que já foi mar
desagua em tempestade
onde Sol não se opõe (está por trás de tudo)
e só fica a espiar.

E a natureza se faz ciranda:
devolve toda água pro céu
que retorna de novo pro mar.

Mas o vento que entra sem chamar
dissipa todas as nuvens (ele não gosta de brincar);
mas nem pense mal dele,
pois é natural das coisas
a brincadeira terminar.

(Berg Nascimento)

* foto de Anahi Santos

http://anahisantos.wordpress.com/


sexta-feira, 25 de março de 2011

Balela filosófica




Caminha-se para o nada
e desse nada surgimos, então:
nada de amor,
nada de amar.

Mas como surge algo do nada
para simplesmente nada ser?

Vez por outras se desencadeiam
essas coisas em minha cabeça.

E fica a angústia do meu nada
a discutir com meu nenhum.

Mas pra quê?

(Berg Nascimento)

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Óbvio Poema





Esqueça a Lua:
Romântica
De amantes
Mortífera.

Esqueça o Mar também:
Vasto
Sepulcro
Espelho.

Tudo já foi dito
De flores
De dores
Pra rimar com amores...

Há poemas onde nem sabias
eles esperam teu novo verbo,
um detalhe oculto,
outra magia.


Por que não
num lápis sem ponta,
no contorcer da lagarta,
na casa vazia?

Sei que nada foge
aos teus olhos,
és oráculo de deuses mudos.
Mas ignore o que é óbvio
não essa homilia.

(Berg Nascimento)

domingo, 6 de fevereiro de 2011

O Tornado





Quero ficar tonto em tua dança
assim, como num parque de diversões
devorado por teu carrossel de almas.

Quero rodar, rodar
e no teu eixo girante
sair em outra dimensão.

E pode me deixar sem eira nem beira
no teu grito sinfônico de restos e poeira.

Talvez encontre Dorothy,
talvez encontre Alice
tão perdidas quanto eu.

E que tua potência
destrua minha casa,
moa minha carne,
extirpe meus sonhos
e me construa de novo.

(Berg Nascimento)

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Armadura de papel


Lutar contra esse amor,

é covardia.

Esse amor me aniquila no primeiro golpe.

É luta perdida…


Impedir esse amor:

Que bobagem!

Se ele flui sem barreiras por todo corpo

e só para onde bem sabe.

(Berg Nascimento)